Liderar e aprender
Para o professor Álvarez de Mon, a liderança é um processo dinâmico que influencia as condutas, os pensamentos e os sentimentos, libertando um caudal de energia e talento humano em prol de um objetivo comum. Neste contexto, liderar e aprender são verbos quase sinónimos. Daí a importância do coaching, do diálogo socrático através do qual se ajuda uma pessoa a descobrir e a utilizar o seu valor interior. Da sua intervenção-diálogo com a audiência presente no evento, salientam-se quatro mensagens chave, que se sumarizam a seguir.
1. Novos líderes para novos tempos
Para este professor universitário no Departamento de Recursos Humanos e organização do IESE em Madrid, doutorado em Sociologia e Ciências Políticas pela Universidade de Salamanca, precisamos de líderes adaptados à nova realidade empresarial, cada vez mais turbulenta e global. Estes são os tempos propícios à descoberta de novos líderes. Líderes capazes de gerir na incerteza, com mentalidade mais global e mais informados. Líderes que:
- Não procuram certezas, mas sim a sabedoria para gerir na incerteza;
- Apostam numa aprendizagem permanente, sua e da sua equipa, para manterem a adaptabilidade e a agilidade num mundo em mudança;
fazem a gestão lúcida dos erros que levam à aprendizagem, mais do procurar a perfeição que não erra, não aprende e não evolui;
- Apostam na criatividade, que não surge de um brainstorming, mas sim de um debate mais profundo que estimule e liberte o talento das equipas;
- Fazem perguntas livres, desafiantes e que escutem as respostas;
- São ambiciosos e otimistas por natureza;
- Livram o talento da ortodoxia e da burocracia das estruturas herdadas.
2. O carácter é um elemento fundamental da liderança
A conjugação da sua vasta experiência profissional como consultor de grandes empresas e coach de gestores de topo com a pesquisa académica, incluindo uma análise pelos clássicos, leva o Professor Álvarez de Mon, a concluir que a liderança se alicerça no caracter. os grandes pilares que sustentam a criação e a renovação permanentes são o talento e o carácter.
O talento humano, se não é orientado por um carácter reto, livre, entusiasta e responsável, desperdiça-se. o carácter suporta a vontade e a disciplina diária que dão significado e produtividade criativa ao talento. Este carácter, tão importante para qualquer pessoa, mas mais ainda para um líder, constrói-se sobre a história passada, íntima e genuína de cada pessoa e sobre a forma como essa pessoa encontrou, resolveu e superou as adversidades.
Adicionalmente, a ideia de liderança não pode nem deve ser despojada da sua dimensão moral. A bondade dos objetivos que motivam um líder, os valores que lhe estão associados – liberdade, solidariedade, justiça, tolerância – bem como os meios que emprega para os atingir, conferem-lhe ou retiram-lhe legitimidade para liderar.
O professor Álvarez de Mon refere o exemplo paradigmático de Nelson Mandela, Prémio Nobel da Paz e primeiro presidente da África do Sul pós-apartheid. Apesar de ter estado numa prisão desenhada para destruir o espírito e a vontade, com contínuas agressões à sua dignidade, nunca renegou às suas convicções, perdeu o autorrespeito ou deixou de acreditar num futuro melhor. Apesar de ter todas as razões para amargurar e odiar, na data da sua libertação, mostrou uma tolerância extrema para com os seus carcereiros. A forma serena como ultrapassou uma experiência extremamente adversa, como manteve a sua humanidade, fortaleceu ainda mais o seu carácter e deu-lhe uma legitimidade acrescida para liderar o país no pós-apartheid.
O carácter, que fornece a força e a determinação necessárias à Acão, são virtudes estratégicas e centrais para os gestores de topo no âmbito de uma sociedade cada vez mais turbulenta em termos de valores, de contextos em mudança, de conflitos, de inovação e incerteza.
“O homem pequeno só se recorda do mal que lhe foi feito. O homem grande recorda-se do bem, e por esse pouco bem que recebe esquece-se de tantos males que recebeu”, anónimo, citado no livro “Desde La Adversidad”, de Santiago Álvarez de Mon.
3. A força da vontade
A maior parte das empresas estão sobrecarregadas de planos, de regras, de comissões, de hierarquias, de sistemas de procedimentos e controlos que constrangem o talento. Estão carentes de intensidade, paixão, entusiasmo, imaginação. Quando as coisas correm menos bem aumentam a dose de ferramentas organizacionais, que têm a sua utilidade, mas não substituem a necessidade da liderança.
O investimento em novos métodos de trabalho e novas ferramentas por vezes perde-se devido a uma radical carência de interesse e motivação das pessoas, esbarrando na apatia. o excesso de lógica, análise e planificação não acrescenta nada, pelo contrário. Somente a vontade de atingir uma visão conjunta, que tem significado para os recetores pode energizar uma organização. Quando algo faz sentido, quando a minha função é relevante, quando tenho espaço vital para crescer, é mais fácil a curiosidade e a paixão pelo trabalho e pela ação instalarem-se na cultura corporativa.
Neste contexto, os planos de carreira, planos de formação, avaliação de 360 graus, coaching e programas de formação são importantes apoios, mas ficam aquém do que é necessário, se não estiverem suportados por lideranças eficazes. Se oferecer aos colaboradores uma causa nobre e atraente ficará surpreendido com a resposta. Para isso é preciso conhecer a realidade dos que o rodeiam, compreendê-los, desafiar o status quo, inovar, ousar ser diferente, confiar no talento, permitir o erro, aprender e celebrar em conjunto, construindo equipas altamente motivadas.
4. A liderança começa no autoconhecimento
O início do processo é o autoconhecimento. Na nova era do conhecimento, serão as habilidades individuais que farão a diferença, e não somente o brilhantismo da alta direção da empresa. Neste contexto, o primeiro passo para a formação e o desenvolvimento de lideranças é o autoconhecimento, a identificação de deficiências e de pontos fortes. Este é um campo no qual todos, sem exceção, podemos trabalhar. Na realidade, todo o processo de desenvolvimento de competências – algo tão difundido atualmente – deve estar centrado, como ponto de partida principal, no conhecimento próprio.
Mas o momento-chave da liderança é a ação, atuando primeiro sobre si próprio, mudando-se antes de mudar os outros. A liderança tem a ver com a capacidade de cada um de nós de sermos melhores, e não apenas com uma característica inata. Essa liderança, não nasce connosco, não se estuda. Pratica-se e aprende-se nas atividades do dia a dia. Não resulta de um grande “bang”. Vivendo, trabalhando, vamos nos aproximando ou afastando dela gradualmente.